
18/09/2025
Por Patrícia Rezende
Vídeo viral do influenciador Felca no mês passado sobre a adultização de crianças na internet, para fins de monetização, denunciou a exploração infantil, impulsionou o debate público, gerou projetos de lei no Congresso e, agora, resultou na criação do “ECA Digital”. O SINIBREF relembra sua atuação pela proteção da infância e reforça o papel das Instituições na transparência e acolhimento.
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A exploração de crianças e adolescentes na internet, a “adultização” tornou-se pauta no mês passado devido ao vídeo do influenciador Felipe Bressanim Pereira, de 27 anos, mais conhecido como Felca.
Os vídeos viralizaram nas plataformas digitais. No Youtube, os quase cinquenta minutos alcançaram a marca de 50 milhões de visualizações. Outra versão, menor, no Instagram, alcançou mais de 190 milhões. O influenciador tocou em um ‘vespeiro’, como ele mesmo diz: expôs um problema muito sério sobre a exposição e adultização infantil. Poucas semanas após o episódio, o alvoroço permanece. O assunto é delicado, gerou fortes reações, resistências e até ataques.
O caso mostrou que uma denúncia bem fundamentada pode mudar a agenda pública. De repente, milhões de pessoas falam de adultização de crianças, um tema que já era monitorado por Instituições representadas pelo SINIBREF, mas que ganhou atenção nacional e internacional após a viralização.
O vídeo
Para quem ainda não assistiu o vídeo completo no Youtube, aqui vai uma parte da contextualização. O youtuber conhecido por conteúdos de reação e denúncias de práticas duvidosas no ambiente digital, chega a mostrar um experimento através de um perfil no Instagram: ele passou a curtir fotos de crianças em contextos sugestivos. O resultado foi imediato, o algoritmo da rede social começou a entregar conteúdos de menores de idade em situações que podem atrair pedófilos, evidenciando como as plataformas digitais acabam por conectar redes de exploração infantil.
Assista aqui: adultização
Resultados da viralização
A denúncia ultrapassou fronteiras: já foi destaque no Jornal das 20h da TVI, em Portugal, e ganhou espaço na mídia italiana. “This video is now reaching Italian news! We should all fight together for a safer Internet” (Este vídeo já está chegando aos noticiários italianos. Precisamos todos lutar juntos por uma internet mais segura), comentou a internauta Francesca Polidori. Nos Estados Unidos, canais no YouTube repercutiram a denúncia e reforçaram a urgência de medidas de proteção digital.
No Reino Unido, a plataforma Euro News Week publicou uma reportagem destacando como o vídeo do influenciador brasileiro expôs falhas graves nas redes sociais na proteção de crianças e adolescentes contra a exploração online.
A dimensão do caso também forçou as gigantes tecnológicas a se posicionarem: a Meta (dona do Instagram) afirmou estar revisando suas políticas de moderação de conteúdos envolvendo menores, enquanto o Google, responsável pelo YouTube, declarou que vai ampliar seus mecanismos de monitoramento para coibir a circulação de vídeos que promovam a adultização ou a exploração de crianças.
Lei Felca
No Congresso Nacional, mais de 30 projetos de lei já foram protocolados para combater a adultização digital e criminalizar a exploração infantil online. No dia 17 de setembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou o Projeto de Lei 2628/2022, agora convertido na Lei Felca, em referência ao influenciador que trouxe o tema à tona.
A lei estabelece medidas inéditas de proteção a crianças e adolescentes no ambiente digital, criando um marco de responsabilidade para as plataformas de tecnologia. Entre os principais pontos estão:
- Verificação de idade: criação de mecanismos para impedir que crianças abram contas sem supervisão.
- Restrições de contato: limitação de interações entre menores e adultos desconhecidos nas redes sociais.
- Remoção de conteúdos nocivos: obrigação de retirar rapidamente conteúdos abusivos, pornográficos ou que estimulem violência e exploração infantil.
- Publicidade direcionada: restrição a técnicas abusivas e manipulativas voltadas ao público infantil, incluindo o uso de inteligência artificial e perfis emocionais.
Com a sanção da Lei Felca, o Brasil passa a contar com um instrumento legal robusto para enfrentar a adultização digital, atualizando o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para a realidade das redes sociais e respondendo ao clamor social gerado pela denúncia.
O texto integral da lei pode ser conferido no site da Câmara dos Deputados: Clique aqui
Dados que reforçaram a urgência da lei
Uma pesquisa Datafolha mostra que 9 em cada 10 brasileiros acreditam que as redes sociais fazem menos do que deveriam para proteger crianças online.
Com essa lei, a partir de agora, plataformas digitais terão que assumir seu papel de corresponsabilidade na proteção da infância e adolescência.
Como a Lei Felca vai funcionar na prática
A Lei Felca atinge todos os serviços digitais (redes sociais, aplicativos, programas e jogos eletrônicos) que sejam direcionados a crianças e adolescentes ou que tenham “acesso provável” por esse público.
Outros pontos detalhados pela lei estão:
- Controle parental: ferramentas configuráveis e acessíveis, obrigatórias para que pais e responsáveis monitorem a atividade de menores; contas de crianças deverão estar vinculadas a responsáveis legais.
- Design das plataformas: empresas precisarão adotar práticas que considerem o impacto do uso excessivo e do design nocivo (como rolagem infinita, notificações constantes, algoritmos de recomendação de conteúdo impróprio).
- Critérios de risco: o regulamento posterior definirá critérios objetivos para identificar conteúdos nocivos e como se dará a verificação de idade.
- Pesquisa e dados: plataformas deverão disponibilizar dados para pesquisa acadêmica sobre os impactos do uso digital por crianças e adolescentes.
Fiscalização e sanções
A lei prevê fiscalização coordenada por órgãos do Governo Federal como: Ministério da Justiça, Ministério dos Direitos Humanos, Ministério das Comunicações e Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).
As penalidades previstas são severas, incluem advertência, multas milionárias por infração, suspensão temporária das atividades e proibição de funcionamento em casos extremos.
R$ 50 milhões é o valor que pode chegar a uma multa por infração, de acordo com a Lei Felca, sancionada no dia 17 de setembro de 2025. |
O prazo previsto para a entrada em vigor das regras é de um ano após a publicação da lei, permitindo adaptação das plataformas.
Denúncias já eram altas antes do vídeo
A Comissão de Direitos Humanos (CDH) no Senado já vinha registrando aumento nas denúncias antes mesmo da repercussão do vídeo. Segundo a SaferNet Brasil, plataforma de denúncias de crimes cibernéticos operada em parceria com os Ministérios Públicos e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH), entre janeiro e julho de 2025 foram registradas 49.336 denúncias anônimas de abuso e exploração infantil, o que corresponde a 64% de todas as notificações recebidas pelo Canal Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos.
No cenário internacional, um relatório da rede InHope, mostrou que o Brasil saltou da 27ª para a 5ª posição mundial entre países com mais denúncias de abuso infantil online, em um universo de 55 países monitorados. Os dados mostram que essa é uma crise global, que exige respostas conjuntas de governos, empresas de tecnologia e sociedade civil.
Esses indicadores deixam claro: o problema já era grave antes da viralização, mas o vídeo deu visibilidade inédita e ampliou a pressão pública para que medidas concretas fossem tomadas.
Em meio a tudo isso, o influenciador ainda divulgou outro efeito: o aumento de doações para Instituições Beneficentes que atuam na proteção da infância. Segundo Felca, em dados ainda não oficiais, houve crescimento de mais de 2.600% em apenas duas semanas após a publicação do vídeo.
O QUE O SINIBREF E AS INSTITUIÇÕES JÁ FAZEM PELA INFÂNCIA Para o SINIBREF e para as Instituições Beneficentes e Filantrópicas o caso coloca a proteção da infância no centro do debate, expõe que a sociedade está disposta a ouvir e apoiar casos de vulnerabilidade, e reforça a necessidade de que o sindicato e as Instituições estejam presentes nessas conversas. Além de pautar debates no Congresso, o SINIBREF tem atuado há anos em favor da defesa da infância. Entre 2024 e 2025, o sindicato distribuiu mais de 25 mil exemplares do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em eventos, seminários e ações locais, com o apoio de suas unidades estaduais. Essa iniciativa reforça o compromisso institucional com a conscientização sobre os direitos das crianças, o mesmo fundamento que sustenta a urgência da Lei do ECA Digital (ou Lei Felca). Já as Instituições, são como os braços e pernas do governo, sem elas, o Estado dificilmente teria a capacidade e agilidade necessárias para responder à demanda crescente por proteção e atendimento. Elas desempenham funções como: Acolhimento e proteção: Instituições oferecem abrigo seguro para crianças em situação de risco, oferecendo apoio educacional e emocional em um ambiente acolhedor e estruturado. Apoio psicossocial e jurídico: Atendimentos especializados são realizados por profissionais que oferecem suporte psicológico e orientação legal aos tutores. Prevenção: Campanhas de sensibilização, ferramentas educativas e a mobilização da comunidade reforçam uma cultura de cuidado, proteção e vigilância ativa, prevenindo novas violações de direitos. |
O que podemos aprender com isso
O recado ficou ainda mais claro, transparência e comunicação não são opcionais. O mesmo público que pede explicações de influenciadores, vai exigir ainda mais de Instituições que recebem doações e recursos públicos.
Também podemos aprender que precisamos dar mais atenção ao impacto das redes sociais. Se milhões de pessoas estão mobilizadas contra a adultização, vemos uma oportunidade de aproximação, na qual gestores devem mostrar como as Instituições já fazem esse trabalho de proteção no dia a dia, com prestação de contas e comunicação acessível à sociedade.
E no fim das contas,o que está em jogo não é a gestão de recursos, a criação de leis, o perigo das plataformas ou as estatísticas, é sobre ter uma criança ou um adolescente por trás das denúncias, precisando de proteção. O desafio, portanto, é coletivo: proteger a infância e preservar o futuro.
“Fui uma criança muito sozinha, abandonada. Que não tinha voz e, quando falava, não tinha ninguém para escutar. (…) E fiz isso porque existem crianças e adultos por aí que foram também a criança que fui: sozinha, sem voz. E se ninguém dá voz a essa criança, ela cresce desamparada, sem perspectiva”, Felca no programa ‘Conversa com Bial.’
O SINIBREF como sindicato patronal segue aqui acompanhando de perto, orientando, lutando e buscando por ambientes melhores nas Instituições para que possam realizar com excelência o trabalho de anos que fazem com as crianças e adolescentes.