A contratação e gestão inadequadas de voluntários e PJs estão entre as armadilhas que podem gerar passivos trabalhistas e comprometer as Instituições

As Instituições Beneficentes, Religiosas e Filantrópicas são movidas pela missão social de acolher, cuidar, educar e oferecer dignidade para as pessoas em situação de vulnerabilidade e que carecem de oportunidades. Para que tudo isso seja cumprido, no entanto, é necessário o emprego de diversas pessoas unidas em prol de uma causa e, claro, de uma gestão responsável e atenta. Por isso, compreender como funciona as relações de trabalho é fundamental para assegurar a continuidade das ações sociais, a proteção da Instituição, bem como o reconhecimento dos profissionais que nela atuam.

Voluntários x CLT

O trabalho de pessoas voluntárias, que contribuem oferecendo tempo de serviço gratuitamente e de forma espontânea é bastante comum em nosso segmento. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), do Instituto Brasilleiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, 7,3 milhões de pessoas declararam trabalhar como voluntárias no Brasil, o que corresponde a 4,2% da população com 14 anos ou mais. 

Esses dados demonstram, em partes, o tamanho do voluntariado no Brasil. No entanto, para as Instituições Beneficentes, Religiosas e Filantrópicas, é fundamental diferenciar o voluntário do contrato de emprego.

Muitas entidades ainda contratam pessoas, seja para atividades administrativas, de limpeza, atendimento ou mesmo assistência direta de forma informal. Essa prática, porém, expõe a Instituição a riscos jurídicos e financeiros, podendo gerar autuações, multas e ações trabalhistas. 

A contratação é diferente do voluntário, que em sua maioria, são pessoas da própria comunidade, familiares ou mesmo beneficiários que querem devolver algo à organização. Esse apoio é importante, mas também não deixa de ser perigoso de certa forma e não pode substituir o trabalhador contratado sob o regime das Consolidações das Leis do Trabalho (CLT).

O voluntário não recebe salário, não tem subordinação formal e deve assinar um Termo de Adesão previsto na Lei nº 9.608/1998, o que não ocorre em muitos casos. Já o empregado cumpre jornada, recebe remuneração e obedece hierarquia. Quando não há diretrizes específicas para o voluntariado, abre-se espaço para o reconhecimento de vínculo trabalhista.

Segundo o advogado Marcelo Pires, o trabalhador voluntário não pode ser remunerado em razão do serviço prestado sob qualquer forma. “A vedação se dá tanto para a remuneração em dinheiro, quanto em bens ou serviços. A única ressalva assegurada na legislação é o ressarcimento de despesas comprovadamente pagas pelo prestador de serviço,” afirma. “Esse ressarcimento não tem natureza de remuneração, ou seja, não é um pagamento feito pelo trabalho, mas apenas uma recomposição feita pelo tomador ao prestador do serviço que havia assumido um gasto em razão da atividade voluntária”.

PJ x CLT

Outra relação que deve ter atenção dos gestores é com o trabalhador Pessoa Jurídica (PJ). O trabalhador PJ geralmente é contratado via MEI ou Ltda na tentativa de reduzir custos e em alguns casos, de mascarar uma relação de trabalho que deveria estar sob o regime da CLT. Ele passa a ter características de vínculo empregatício quando exerce funções que exigem subordinação, não eventualidade, onerosidade e pessoalidade, conforme tabela abaixo.

A ‘pejotização’ muitas vezes parece mais prática e mais ‘barata’ para a Instituição, o que muitos não sabem, porém, é que ela pode implicar riscos caso utilizada de forma incorreta. E isso se mostra através dos dados, já que tem sido uma das principais causas de disputas trabalhistas no Brasil. Segundo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), o número de ações envolvendo contratação via MEI aumenta cerca de 15% ao ano.

Entre 2019 e junho de 2023, a Justiça do Trabalho recebeu aproximadamente 780 mil ações com pedidos de reconhecimento de vínculo empregatício relacionados à pejotização e práticas associadas.

Ainda de acordo com o TST, em 2024, foram ajuizadas 285.055 ações disputando o vínculo empregatício com base na contratação PJ, aumento de 57% em relação a 2023, sendo 53.783 casos apenas até fevereiro de 2025.

Para o jurista, isso tem acontecido porque “o contrato de emprego possui forma livre, ou seja, pode ser escrito, verbal ou tácito. Assim, a mera ausência de contrato de emprego não inviabiliza o seu reconhecimento, quando presentes todos os requisitos próprios desta relação”, adverte.

Implicações para as Instituições e como evitar

A contratação via PJ tem gerado consequências, o especialista lembra que “caso o prestador entenda que o serviço informal seja realizado com a presença de todos os requisitos do contrato de emprego, poderá ser reconhecido o vínculo empregatício e, uma vez reconhecido, o tomador ficará obrigado a quitar todas as parcelas decorrentes deste tipo de contrato”. Além da busca por reconhecimento por parte dos empregados, outras implicações são:

Para evitar as possíveis implicações, a Instituição deve analisar corretamente a natureza da função, novamente, se há subordinação, não eventualidade, pessoalidade e onerosidade, o vínculo deve ser formalizado como CLT.

Recomendamos o uso de contratos PJ apenas para serviços autônomos genuínos, sem vínculo empregatício como por exemplo para consultorias específicas e ou  atividades esporádicas sem subordinação.

Formalizar os contratos de prestação de serviços, indicando claramente a autonomia do prestador, escopo de trabalho e ausência de obrigações típicas de empregado também é uma forma de futuramente, se necessário, comprovar a confiabilidade da Instituição na contratação do profissional.

Quando  o CLT é a melhor opção para as instituições?

O regime CLT aumenta a segurança jurídica da Instituição, protege as ações sociais e fortalece o segmento pois respeita a legislação e reduz o risco de passivos trabalhistas. 

É certo que a legislação e a jurisprudência reconhecem a legitimidade da contratação realizada sob tipos contratuais, mas é de suma importância avaliar as exigências legais e as necessidades do contratante.

A contratação formal permite aplicar corretamente a Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) firmada pelo SINIBREF e o cumprimento da mesma, que oferece proteção em disputas sindicais ou judiciais.

Os passivos de ações de recursos trabalhistas por contratações informais são mais caros do que os custos de encargos de contratação. Sem falar na responsabilidade social da entidade ao mostrar que valoriza os empregados com direitos assegurados coerentes com a missão das Instituições Beneficentes, Religiosas e Filantrópicas.Por isso, “é indispensável conhecer as modalidades de prestação de serviço. (…) Ocorre que cada um dos tipos contratuais possui particularidades que podem ser adequadas ou não às necessidades do tomador. Uma consultoria jurídica e contábil irá minimizar os riscos relacionados aos contratos, indicando o formato que ao mesmo tempo reduza o custo do tomador, mas que também lhe dê a segurança jurídica necessária”, finaliza o advogado.

O SINIBREF está ao lado das Instituições para orientar, representar e apoiar no cumprimento das relações trabalhistas. Juntos, lutamos por segurança jurídica em todos os âmbitos de nossas relações.